domingo, 25 de julho de 2010

Vida centrífuga

O menino abre com carinho e medo o álbum de retratos
Ele vê rostos e sorrisos que um dia ele teve.
Alguns, que surpresa, são quase desconhecidos, semi-apagados.
Memória vã, sofre toda uma higiene.
Os rostos vão passando e ele reconhece presidentes, generais e reis.
Até mesmo uma odalisca.
Ele busca entender como seu mundo se expandia, como cabia em seu coração
Tanta gente.
E cabia.
Mas uma escolha, uma curva que se vira. E quando olha pra trás.
Ninguém o acompanha. Ele se recolhe e tropeça. Mas há novas mãos ali
Pra amparar a sua queda.
Ele fecha os olhos e agradece.
Mas esse ir e vir o incomoda. Ele tenta descobrir uma alternativa.
Ele decide lutar.
Luta com armas tecnológicas, abre uma janela e diz alô.
Luta com as ondas analógicas e digitais.
E diz, quero te ver.
Luta contra o tempo que o devora e se disfarça de “Não tenho tempo”.
Ele percebe que algumas pessoas nunca voltarão. Mesmo.
Mortas em vida, foram sumindo no horizonte, e o vento nunca lhes soprou
Para a praia.
E no tácito dizer adeus cotidiano,
Vão-se os anéis, ficam os dedos.
Sentimentos se espalham pelo chão, grãos de areia,
escoam pelo ralo.
Um telefonema se cala. Um eterno status ausente.
Não tenho seu MSN, até nunca mais.
Alguns vão, e não deixam saudade.
Fica parecendo até, um certo alívio?
Outros voltam, direto das catacumbas.
E lutam para permanecer, mesmo na
Hegeliana aventura
Na grande ontologia
Do mover-se.
E os movimentos centrífugos
Empurram para fora das nossas vidas
Como água da máquina de lavar
Doces sorrisos, palavras encantadoras.
E ela te interpela:
Vai aceitar e submeter-se ou tentar reforçar os laços que eu enfaqueço
Com minhas cidades e labirintos e movimentos
Sem eternos retornos, sem nenhum retorno?
(Talvez eu seja o último romântico.)
Mas o menino vê sombras ao seu redor, que lhe estendem a mão
Ao tocá-las, elas se materializam em conselhos e conversas e alegria compartilhada.
Ele vê que algumas pessoas naquelas fotos, continuam vibrantes, claras e definidas
Em seus contornos.
Estão ali.
E o menino decide virar clichê.
Se inspira e respira, grita a toda voz,
Lutar vale a pena, se a alma que fica não é pequena!